Trabalhadores, sindicatos, escritórios de contabilidade e até de RHs de empresas tem dúvidas sobre como proceder durante a quarentena recomendada devido à pandemia decorrente do COVID-19.

Em uma situação complexa como o atual, a melhor atitude a se tomar é utilizar o bom senso e a razoabilidade, levando em consideração que nem o trabalhador estavam preparados para esse momento. Nem mesmo as normas legais poderão desconsiderar o contexto de crise mundial que vivenciamos na saúde pública e que reflete na relação empregado/empregador.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) sugere algumas possibilidades legais para conduzir nessas questões, já que é notável que muitos empregadores estão apreensivos com a possibilidade de seus empregados serem obrigados a ficarem em casa por conta da contaminação do vírus.

É fato que qualquer decisão do empregador no sentido de afastar o trabalhador de suas funções devido às atuais circunstância implica em convocar o Sindicato da categoria para discutir sobre as possibilidades cogitadas, evitando assim informações desencontradas entre o empregador e a entidade sindical representativa da categoria.

De todo modo, vejamos as possibilidades:

  • A CLT prevê a possibilidade de implantar banco de horas, ocasião em que os trabalhadores não prestarão seus serviços por um determinado número de dias e não terão prejuízo quanto aos salários, entretanto, retornando ao trabalho, trabalharão duas horas extras diárias até compensar as horas que deixaram de trabalhar e nessa condição não receberão por essas duas horas. Por se tratar de um tema que envolve coletivos, setor ou setores da empresa deverá o banco de horas decorrer de negociação com o Sindicato da categoria para maior segurança jurídica.
  • Existe também a possibilidade das férias coletivas. Como o negociado prevalece sobre o legislado, poderiam as partes, mediante acordo coletivo, abolir a necessidade de pré-aviso de 15 dias ao Ministério da Economia e ao Sindicato.
  • A reforma trabalhista de 2017, possibilitou a prestação de serviços do empregador fora das dependências da empresa com a utilização de tecnologia da informação. Para algumas atividades esse contrato pode ser adotado com sucesso pelas partes envolvidas.
  • Outra possibilidade é a licença remunerada, que mesmo sem previsão expressa na CLT, é plenamente possível.
  • Outra alternativa seria a suspensão do contrato de trabalho para cursos de qualificação profissional.
  • Poderia também ser negociada uma suspensão temporária do contrato de trabalho com pagamento de um abono mensal e manutenção de alguns benefícios previstos em norma coletiva da categoria (por exemplo cesta básica, convênio médico). Segundo a CLT, o negociado prevalece sobre o legislado em algumas situações.
  • Em caso de empregado adoecido, a proteção previdenciária será colocada em prática, percebendo o auxílio devido por lei.

A negociação coletiva exige a realização de assembleias dos trabalhadores envolvidos e que, obviamente seria um contrassenso reunir aglomerações de trabalhadores num único ambiente para deliberações. A sugestão é que se utilizem da tecnologia para deliberação do tema com os trabalhadores. As empresas possuem os contatos telefônicos dos trabalhadores e os passariam ao sindicato da categoria que ficaria encarregado de, por exemplo, formar um grupo específico de WhatsApp para a comunicação dos atos e deliberações, se possível. Também os trabalhadores poderiam escolher uma comissão que ouviria internamente, na empresa, todos os trabalhadores e levaria a decisão para a entidade sindical. É necessário ser criativos e ponderados num momento de tanta apreensão.

Vale também citar a previsão do art. 486, da CLT:

  • No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.
  • Sempre que o empregador invocar em sua defesa o preceito do presente artigo, o tribunal do trabalho competente notificará a pessoa de direito público apontada como responsável pela paralisação do trabalho, para que, no prazo de 30 dias, alegue o que entender devido, passando a figurar no processo como chamada à autoria.
  • Sempre que a parte interessada, firmada em documento hábil, invocar defesa baseada na disposição deste artigo e indicar qual o juiz competente, será ouvida a parte contrária, para, dentro de três dias, falar sobre essa alegação.
  • Verificada qual a autoridade responsável, a Junta de Conciliação ou Juiz será considerada incompetente, remetendo os autos ao Juiz Privativo da Fazenda, perante o qual correrá o feito nos termos previstos no processo comum.

Especificamente no COVID-19, o Estado pode ser responsabilizado por eventual paralisação das atividades do empregador, justamente por se tratar de uma situação de força maior. Dessa forma fica evidente que não existe sustentação acerca da aplicação do preceito supramencionado.

Texto original por Cesar Augusto de Mello