Certo é que os litígios não podem perdurar por anos sem que haja efetiva tentativa de localização da parte executada ou valores e bens que possam ser penhorados para satisfação da obrigação, sob pena de se ter processos infindáveis.

Isso porque o processo não pode se transformar em mera ferramenta de cobrança, sem efetiva participação das partes, com prejuízo, inclusive, à administração da justiça, sendo uma das metas do CNJ e do legislador promover a solução rápida dos litígios. Ora, os litígios não podem se alongar por anos, em detrimento ao princípio constitucional da razoável duração do processo.

Conquanto o Código de Processo Civil de 1973 não previsse a possibilidade de a execução ser extinta no curso da demanda pela inércia do exequente, com o passar dos anos a doutrina e a jurisprudência começaram a indicar a possibilidade de prescrição intercorrente, de modo que, conforme será demonstrado, também às ações sob a vigência desta lei devam sofrer seus efeitos.

Quanto ao prazo da prescrição intercorrente e seus primeiros parâmetros, trouxe Enunciado 150 do E. Supremo Tribunal Federal (1963) a seguinte redação: “Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação”.

Na sequência, ainda em 1963, foi elaborado o Enunciado 264 do E. Supremo Tribunal Federal, que apresentou a prescrição intercorrente: “Verifica-se a prescrição intercorrente pela paralisação da ação rescisória por mais de 5 anos”.

O Código de Processo Civil de 2015, por sua vez, trouxe explicitamente a hipótese de prescrição intercorrente nas execuções.

Ou seja, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, indiscutíveis os marcos temporais para que a prescrição intercorrente seja declarada.

Em um primeiro momento, para que se opere a prescrição intercorrente, é necessário não serem localizados bens do devedor passíveis de penhora, o que gera a suspensão do processo por 1 (um) ano, independentemente de serem os autos remetidos ao arquivo. Decorrido este prazo, começa a correr o prazo da prescrição intercorrente, a qual pode ser declarada até mesmo de ofício.

Após o arquivamento, não mais é exigida a intimação do exequente para dar prosseguimento à execução, podendo, apenas, se manifestar sobre eventuais causas de suspensão ou interrupção da prescrição.

Assim é a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, manifestada no julgamento do REsp n. 1.604.412/SC, de junho de 2018, que estabeleceu a interpretação da regra de transição entre os Códigos de Processo Civil (1973/2015).

Pouco tempo depois, ainda no mesmo ano (2018), por meio do REsp n. 1.340.553/RS, julgado sob o regime de recursos repetitivos, entendeu-se que “o prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei n. 6.830/80 – LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução”.

Portanto, não mais se exige decisão judicial expressa determinando a suspensão para que ela ocorra. Ainda que o julgado se refira a execuções fiscais, com a reforma da Lei 14.195/2001 aplicou-se o mesmo entendimento ao Código de Processo Civil.

O § 4.º do art. 921 do Código de Processo Civil previa que a prescrição começava a correr após o prazo de um ano de suspensão sem manifestação do exequente e, nos termos do seu inciso III, era hipótese de suspensão apenas a não localização de bens passíveis de penhora.

Por seu turno, pela alteração trazida pela Lei n. 14.195/2021 na redação deste dispositivo legal, a suspensão ocorre também quando o executado não for localizado (inciso III), passando a ter como termo inicial da prescrição, em seu §4º, “a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis”.

Mais ainda, o § 4.º-A determina como causa de interrupção da prescrição a efetiva citação/intimação do devedor ou constrição de bens penhoráveis, desde que o credor cumpra os prazos previstos na lei processual ou fixados pelo juiz.

Destaca-se: o mero peticionamento requerendo a penhora sobre ativos financeiros ou bens passíveis de penhora, bem como a mera instauração de incidente de desconsideração de personalidade jurídica ou formulação de pedido de desarquivamento dos autos, não são o suficientes para interromper o curso da prescrição intercorrente. Para que ocorra a interrupção, nos termos do art. 921, parágrafo 4º-A, do Código de Processo Civil, é necessária a efetiva citação/intimação do devedor ou constrição de bens penhoráveis.

A aplicação do disposto na nova redação do art. 192 do Código de Processo Civil aos casos sob vigência da lei anterior ainda é controversa, vez que a lei não retroage. Por seu turno, a interpretação do que vem a ser a inércia do exequente varia, mesmo nos casos regidos pelo Código de Processo Civil de 1973.

Nesse diapasão, importante mencionar os seguintes julgados, que aplicam, por analogia, o disposto no art. 40 da Lei de Execuções Fiscais aos processos sob a vigência do Código de Processo Civil de 1973:

“APELAÇÃO CÍVEL – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – CONTRATO DE LOCAÇÃO – SENTENÇA QUE JULGOU EXTINTO O FEITO PELO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – INCONFORMISMO FORMALIZADO – ALEGAÇÃO DE QUE NÃO HOUVE INÉRCIA, APENAS AUSÊNCIA DE LOCALIZAÇÃO DE BENS PENHORÁVEIS – INEXISTÊNCIA DE SUSPENSÃO DO PROCESSO – AUSÊNCIA DE PARALISAÇÃO DO FEITO – NÃO ACOLHIMENTO – PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE CARACTERIZADA – INTELIGÊNCIA DO ART. 206-A DO CC/02 – CONTRATO DE LOCAÇÃO – PRESCRIÇÃO TRIENAL DO DIREITO MATERIAL – INÍCIO DA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO A PARTIR DO DECURSO DE 1 ANO APÓS A AUSÊNCIA DE LOCALIZAÇÃO DE BENS PENHORÁVEIS – ANALOGIA COM O ART. 40, § 2º DA LEI 6.830/80 – DILIGÊNCIAS INFRUTÍFERAS QUE NÃO INTERROMPEM O PRAZO PRESCRICIONAL – PRECEDENTES STJ – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJPR – 18ª C. Cível – 0008279-97.2013.8.16.0001 – Curitiba – Rel.: JUÍZA DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU ANA PAULA KALED ACCIOLY RODRIGUES DA COSTA – J. 09.08.2021) (TJ-PR – APL: 00082799720138160001 Curitiba 0008279-97.2013.8.16.0001 (Acórdão), Relator: Ana Paula Kaled Accioly Rodrigues da Costa, Data de Julgamento: 09/08/2021, 18ª Câmara Cível, Data de Publicação: 11/08/2021)

“APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS. INEXISTÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. CONHECIMENTO PARCIAL. CHEQUE. AUSÊNCIA DE BENS PENHORÁVEIS. SUSPENSÃO. DECURSO DE UM ANO. ARQUIVAMENTO. INÍCIO DO PRAZO PRESCRICIONAL DE SEIS MESES. ART. 59 DA LEI Nº 7.357/85. INTIMAÇÃO. PRESCINDIBILIDADE. REQUERIMENTOS MANIFESTAMENTE NÃO EFETIVOS. REITERAÇÃO DE DILIGÊNCIAS INFRUTÍFERAS. IRRELEVÂNCIA. INTIMAÇÃO ANTERIOR AO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO. VERIFICAÇÃO. PRETENSÃO PRESCRITA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO EM FAVOR DO EXEQUENTE. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. Evidenciada a ausência de interesse recursal do apelante, resulta obstado o conhecimento do recurso no particular. 2. É de 6 (seis) meses o prazo prescricional para a execução de cheque, contados da expiração do prazo de apresentação, nos termos do art. 59 da Lei nº 7.357/85. 3. Ultrapassado o prazo prescricional da pretensão executória, que, no caso, é de seis meses, contado a partir do dia subsequente após decorrido um ano de suspensão, ainda que reiteradas pesquisas anteriormente requeridas, mas infrutíferas, perdurando a ausência de bens penhoráveis, opera-se a prescrição intercorrente. 4. Conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça, é desnecessária a intimação do credor para dar andamento ao feito antes de reconhecida a prescrição intercorrente, sendo impositiva, tão somente, sua intimação para que apresente eventual matéria de defesa, em atenção ao contraditório. 5. “Consoante a jurisprudência de ambas as Turmas que compõem esta 2ª Seção, a decretação da prescrição intercorrente por ausência de localização de bens penhoráveis não afasta o princípio da causalidade em desfavor do devedor, nem atrai a sucumbência para a parte exequente” (AgInt nos EDcl nos EAREsp 957460, Relatora Ministra Nancy Andrighi, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 18/2/2020, DJe 20/2/2020). 6. Apelação conhecida em parte e, na extensão, parcialmente provida.” (TJ-DF 00233952720158070001 DF 0023395-27.2015.8.07.0001, Relator: SIMONE LUCINDO, Data de Julgamento: 15/09/2021, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no PJe: 05/10/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Caso a tese seja consolidada, milhares de processos ao redor do País serão extintos, sendo um marco histórico que colocará fim aos litígios que perduram por anos sem quaisquer medidas efetivas para a satisfação dos créditos exequendos.

Assim, o exequente deve atuar de forma diligente e rápida, promovendo atos efetivos para a citação/intimação do devedor e constrição patrimonial capaz de satisfazer a execução, sob pena de ver prescrita a ação. Por parte do devedor, importante verificar se se operou a prescrição intercorrente, o que enseja a extinção da execução.

Qualquer que seja o seu caso, consulte um advogado para receber as melhores orientações.

Autora: Marina de Jesus Lameira Carrico Nimer, advogada.

Pós-graduada em Direito Processual Civil (UNOPAR), Direito Digital (UNOPAR), Direitos Humanos (CEI) e Direito Penal Econômico e Europeu (IBCCRIM em parceria com o IDPEE da Universidade de Coimbra); Graduada em Direito (PUC/SP).